Opinião

O racismo que está no cotidiano

Por Sandro Mesquita
Coordenador da Central Única das Favelas (Cufa) Pelotas e Extremo Sul
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Inevitavelmente, algumas das nossas opiniões emitidas nas páginas desse estimado Jornal não são tão agradáveis assim, dependendo do ponto de vista do leitor. Mas o cenário, os fatos e acontecimentos também não têm sido lá grande coisa.

A naturalização de algumas práticas que atingem diretamente a humanidade das pessoas, a banalização da vida de uma maneira geral, a humilhação do semelhante por ele não fazer parte do mesmo estrato social, etnia ou comungar da mesma opinião política, do mesmo time de futebol, enfim, não fazer parte da mesma "tribo". Eu poderia falar aqui de toda e qualquer forma de conceito pré concebido a um ser humano, mas vou falar sobre os últimos acontecimentos em relação às pessoas negras que são veiculados em canais de comunicação. E cito aqui os casos do Seu Jorge, Eddy Jr. e Vinícius Junior. Vou falar sobre a estrutura histórica, educacional e cultural da nossa sociedade que precisa ser desconstruída por nós.

O que as pessoas aqui citadas têm em comum além do fato de serem negros? De serem famosos e referência nas suas respectivas áreas e terem situação financeira que se pode dizer estável? Nenhum deles é aceito e/ou respeitado por uma parcela da sociedade hipócrita e racista que se entende melhor ou superior a um semelhante. Aqui cai por terra a teoria do racismo ser um aspecto econômico. Ele existe mesmo com tantas provas de pessoas negras (não que tivessem que provar alguma coisa) que se destacam em vários segmentos criando, inventando, superando obstáculos, quebrando recordes e trazendo alegria, satisfação e outros sentimentos, prestando um serviço a humanidade.

Agora, se pessoas que têm um certo prestigio e admiração são hostilizadas, xingadas, vaiadas e até juradas de morte, imaginemos os vários negros e negras que são "invisíveis" e passam desapercebidos para tantas questões importantes. Que não são contabilizados em estatísticas para criação de políticas públicas. Que são os primeiros nas taxas de analfabetismo, os primeiros a serem demitidos, isso quando conseguem se inserir no mercado de trabalho. Que são exterminados pela polícia, na polícia. Perseguidos todos os dias nos supermercados, nas ruas, nos ônibus, nas universidades, na vizinhança. Filhos e netos da escravidão, impactados pela falta de estrutura e de políticas, pela ausência do Estado. Herdeiros da miséria, da fome, do descaso. Alvos de bullying, cancelamento, desprezo.

E isso não é mimimi! É um fato. Precisamos, enquanto sociedade, dar a devida atenção ao tema e compreender que, sem a aplicação das leis tanto de educação sobre a história do povo negro nas escolas e universidade, quanto as leis de punição a quem insiste em destratar a maioria da população. Em consonância com a construção e implementação de políticas de inclusão, antirracista e a promoção da equidade. Sem isso, não teremos desenvolvimento social, econômico, intelectual e, sobretudo, humano. Claro, sempre tensionando o poder público a fazer sua parte.

Me parece nítido que todo o desenvolvimento que vejo e ouço ser pregado por tantos setores, gestores e postulantes a cargos eletivos está diretamente ligado a essa questão, pois uma sociedade como a brasileira - e cidades como Pelotas, necessitam dar conta das pessoas que historicamente foram alijadas de toda sorte de políticas de desenvolvimento no amplo entendimento da palavra.

É necessário empatia, permitir a desconstrução do racismo interiorizado silenciosamente e, pela educação, admitirmos a existência dele, estando à disposição pra contribuir com toda e qualquer estratégia ou ação que seja ou pretenda ser um ativo de construção de uma sociedade sem qualquer tipo de pré conceito ou discriminação.


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